minha infância
coube numa caixa.
de sapato,
tamanho 35.
ao abri-la,
sem trinco,
um piano azul
sem bateria,
antigo e novo,
quem diria:
eu nunca fui pianista.
um jogo de lápis bicolores,
todos com a ponta em crista,
intactos:
desenhos que deixei
pr'algum dia.
uma engenhoca
em forma de ovo
que, ao girar,
partia-lhe a casca:
passarinho gerado
e jamais nascido.
e coisas de menina:
meu primeiro vestido,
um urso agarradinho,
a caneta cor-de-rosa
com o meu nome bordado.
cheques.
dentro da caixa, outra caixa:
como soluço guardado.
um globo sem eixo:
o mundo sem gravidade.
o desleixo de uma trena quebrada:
as medições de felicidade.
ao lado,
o noivo e a noiva de espuma
em branco encardido
ao aguardo de maio
a sorte eleita por um papagaio.
a grafia de quem me fez papel.
nessa caixa
de Melissa
que não tive
quando pequena.
que preguiça,
ainda calço 35.
Escrito durante as oficinas do projeto Ave, Palavra,
promovido pela livraria A Terceira Margem.
13 comentários:
Às infâncias que guardamos.
35 ainda é seu número
suas letras
- porém -
de verso ficaram!
Belo, como sempre!
lindo
Gosto dos pequenos (grandes!) achados em seus escritos: frases lapidares, mudanças bruscas de rota, a surpresa deliciosa de descobrir-me no alheio de outras palavras.
Faço eco aos outros comentários: belo!
às lembranças que guardamos, de uma infância diferente ou exatamente do mesmo tamanho! =)
bjs!
Simplesmente inspirador!!
Aplausos!
Renata,
Muito bom o seu espaço.
Fico atraído por todo tipo de inventário pessoal. Acho tratar de oportunidade única para entendermos o que se passa conosco e tudo a sua volta.
Levo conceitos interessantes para o meu espaço.
Parabéns.
Forte abraço.
agamenonplait.blogspot.com
Renata, minha querida amiga "Carioca do Brejo". Adoro ler o que você escreve. Você passeia nos versos. Maravilha!
Beijo
Manoel
Pra embalar o espírito do mês, haha!
Muito bom!
Lembrou-me do Fabuloso Destino de Amélie Poulain.
Muito bom, em todos os tons e tomadas!
Oi Renata
Como me emociona e me faz bem um lindo poema como este
Grande Renata.
Maravilhoso esse poema. Parabéns!!!
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