segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017
Vida
Clique antes de iniciar a leitura.
que silêncio é esse
que desassossega?
que som é esse
que cega?
que voz é essa
que some?
que luz é essa
no breu?
que sol é esse
só meu?
que chama é essa
que consome?
que sopro é esse
que desce?
que brisa é essa
que aquece?
que ar é esse
que é fome?
que chão é esse
que acolhe?
que solo é esse
que recolhe?
que casa é essa
a do homem?
que noite é essa
vermelha?
que sono é esse
centelha?
que sonho é esse
sem nome?
domingo, 19 de fevereiro de 2017
Assim seja
ouço o sino da igreja.
é domingo, começa a missa.
o sol já lambe o lençol e atiça rubores.
a cama por fazer, a alma de joelhos, confesso-me.
errei todas as vezes, errei - digo ao espelho.
e ele se põe a exibir o passado em plano-sequência, todo um roteiro
[de improviso.
errei o tempo, as falas, os gestos, o choro, o riso.
não sou atriz, não sei ser personagem de mim mesma.
errei todas as vezes porque quis, à ignorância do que queria.
coisa mais difícil essa de se conhecer assim, dentro e fora.
eu, cotovia ao céu na inexperiência das asas.
a água no rosto me benze.
perdão - peço a mim e a você.
poema é prece a que se reza sem pressa.
desnecessário crer.
a palavra entra pela fissura, a palavra fura, a palavra enche de luz
[quartzos opacos.
a manhã segue em procissão.
ao som de um canto pagão, bebo da taça de vinho tinto deixada à mesa.
e comungo da beleza que a janela revela: a dança das nuvens
[às escusas do vento.
Tela: A Virgem, de Gustav Klimt.
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017
Sonambulismo
despertei
num sonho
com a dúvida
de quanta vida
disponho? e me
pus a contar o ar
molécula a molécula
e faltava. não havia
ar para tanto fogo.
o desejo não era
pouco, fiquei a
relembrar as
ardências
febrícula por febrícula
e desmaiei.
e acordei num
outro sonho com
a dúvida de quanta
vida disponho? e me
pus a contar os mares
gotícula por gotícula
sem pressa. era ali que
o desejo habitava. era
essa a sua natureza
: o desejo é coisa
das águas. vem
da profundeza
náugrafo a náufrago
Imagem daqui.
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017
domingo, 5 de fevereiro de 2017
Mulher
eu sou toda purpurina
sob a pele de cetim
poeira brilhante e fina
um cromossomo me fez assim
um cromossomo me fez assim
menina, era boneca
com vestido de jardim
orvalho que nunca seca
o espelho viu e contou pra mim
o espelho viu e contou pra mim
pareço falar demais
mas toda história é sem-fim
palavras pelos varais
o homem diz que falo em latim
o homem diz que falo em latim
tenho garras de leoa
e colo de querubim
sou mãe de qualquer pessoa
o amor se inventa no camarim
o amor se inventa no camarim
a rotina de armadilhas
ameaças de festim
com a força das virilhas
a mulher voa do trampolim
a mulher voa do trampolim
Tela de Frida Kahlo.
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017
Corrente
há um fio
invisível
que une
memórias
de ponta
a ponta
toda conta,
lembrança
a cada miçança,
nós
um fio
comprido
que liga
estórias
ponto
a ponto
todo conto,
segredo
a cada enredo,
nós
arrebentou-se o fio
cederam-se as margens
colhi os seixos rolados
emergiu você
Após leituras de Psicologia, em dia de Iemanjá.
terça-feira, 31 de janeiro de 2017
Eu me importo
quem você pensa que é
pra fazer o que bem quiser
consigo?
sim
eu não sou seu amigo
nem sei o seu nome
mas há algo que nos liga
: pelo umbigo
o ar que você respira
também é meu
o sol
a lua
as estrelas
você está
sob o mesmo céu
que eu
que distância
pode existir entre nós
se você escuta
a minha voz?
somos feitos do mesmo barro
da mesma proporção
de água e terra
e você insiste
em me chamar
de outro
em me julgar
estranho
em me declarar
guerra
não
você não sabe
que eu sou você
em algum momento
na dor
no amor
na alegria
somos sempre
um só
ao relento
a vida
é labirinto
de espelhos
é que muitos andam
de olho vendado
você acha que segue
um caminho distinto
mas a Terra nos gira
pro mesmo lado
Para Felipe Saleme, em 2012.
domingo, 29 de janeiro de 2017
terça-feira, 17 de janeiro de 2017
Habite-me
obra,
preciso de
guarda-corpo
and'aime
e roda-pés
Imagem: eu em Kiss, inspirado por Gustav Klimt - Kaliningrad Amber
sábado, 14 de janeiro de 2017
Cristalino
ainda procuro você
em meus olhos
vasculho à lupa
o vão da retina
e ali encontro
só luz e névoa
você me vendo
e vindo neblina
as mãos côncavas
o coração convexo
a vontade convicta
o cérebro perplexo
até que dos olhos
ele inverte a poesia
e o vislumbre da volúpia
se esvazia
Fotografia: eu, por Felipe Saleme.
domingo, 4 de dezembro de 2016
Hóspede
Gullar não morreu
- só foi habitar poema
mais perto de Deus -
Fotografia: Ferreira Gullar (10.09.1930 - 04.12.2016)
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domingo, 20 de novembro de 2016
Ordem
o céu me disse:
_ pede
pedi - pedi - pedi
e o céu me disse:
_ receba
recebi - recebi - recebi
e o céu me disse:
_ cede
cedi - cedi - cedi
e o céu me disse:
_ sobe
subi
Ao meu tio Geraldo.
sábado, 17 de setembro de 2016
Fortaleza
a dor da ausência
a perda da forma
a recusa do toque
o medo da recidiva
a mulher viva de peito vazio
a mulher viva e o peito vazio
a mulher viva e o vazio
mulher e vazio
mulher
Escrito após o filme Aquarius, com Sônia Braga.
Fotografia: Aquarius.
domingo, 21 de agosto de 2016
Andaime
ergui um castelo para matrioskas
:
tijolos de papel
argamassa de palavras
:
piso de madeira
casa sem fundação
:
voaria
:
:
:
:
não fosse o peso de quem o habita
em sigilo
Fotografia: Helena Terra.
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palavra
domingo, 7 de agosto de 2016
Mano amigo
Depois de Doce de lira, poesia à mesa, publiquei Mano amigo,
com o incentivo da Lei Murilo Mendes edição 2014.
Lançado na 1ª Bienal do Livro de Juiz de Fora, no dia 15/06/2016,
Mano amigo já foi também apresentado:
- no Centro Educacional Mundo Encantado, em Juiz de Fora;
- no Festival de Inverno de São João Del Rei 2016, e
- no Centro Cultural Yves Alves, em Tiradentes.
em 10/09/2016, realizarei outra sessão de autógrafos em Juiz de Fora.
De livro, Mano amigo ainda passou a projeto,
o qual compreende a confecção de dedoches artesanais,
a realização de palestras para pais e professores,
e de oficinas para crianças de até 7 (sete) anos.
Obrigada a todos pelo carinho, apoio e convites que tenho recebido!
Escrever tem me proporcionado belíssimos encontros.
domingo, 29 de maio de 2016
Inconfidente
todo aquele que escreve transborda.
ainda que se escreva em um diário,
o cadeado a servir-lhe de tranca,
há somente a ilusão do segredo:
as confidências pertencem ao mundo.
todo aquele que escreve denuncia.
ainda que se escreva uma carta,
o nome do destinatário ao envelope,
há somente a ilusão do sigilo:
as notícias pertencem ao mundo.
todo aquele que escreva forja.
ainda que se escreva um soneto,
a rubrica sob os versos medidos,
há somente a ilusão da autoria:
as artes pertencem ao mundo.
e, afinal, se tantos escrevem,
é porque a existência
se exige compartilhada.
há somente a ilusão do corpo:
as vidas pertencem ao mundo.
sábado, 30 de abril de 2016
7 anos de Doce de lira
O blog Doce de lira completou 7 anos no dia 11 de abril,
com mais de 50.000 acessos.
Muito obrigada a todos que o acompanham,
comentam as postagens e me escrevem!
É sempre muito gratificante conviver com vocês
aqui e no Facebook (cliquem para acessar a fanpage).
Beijos da confeiteira!
domingo, 3 de abril de 2016
Inefável
sabe esse silêncio que você insiste
em se impor para melhor sobreviver
ao caos do mundo? desista.
aceite que a mente mente.
é ruído o silêncio que ela emite.
é burburinho a paz que ela inventa.
impossível criar silêncios...
são eles que antecedem as criações.
o silêncio que você busca já existe:
na infinita porção de nada que o habita.
o caminho? ausentar-se de si.
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016
Percalço
você não perde a cabeça
até que a perca
cuidado
para perceber
Poema de carnaval.
Imagem: Mula sem cabeça, de José Cláudio.
segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
segunda-feira, 11 de janeiro de 2016
O caminho do meio
o bem entre o mal
o acerto entre o erro
a beleza entre a feiura
a alegria entre a tristeza
a vitória entre a derrota
a vigília entre o sonho
- o convite -
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